A defesa do ex-ministro José Dirceu (Casa Civil) enviou ao STF (Supremo Tribunal Federal) ontem os recursos contra sua condenação a mais de 10 anos no julgamento do mensalão com a estratégia inicial de diminuir sua pena. Seu advogado, José Luis Oliveira Lima, não tenta em nenhum momento provar a inocência de Dirceu em relação ao entendimento do Supremo de que ele cometeu os crimes de corrupção ativa e quadrilha. Se concentra, porém, em apresentar argumentos de que as penas foram calculadas erroneamente e podem ser reduzidas –e que, se aceitos, livrariam o ex-ministro do regime fechado.
O STF concluiu no fim de 2012 o mais longo julgamento de sua história, que durou quatro meses e meio e acabou com 25 réus condenados. A corte concluiu que o esquema foi organizado pela antiga cúpula do PT, incluindo Dirceu, com a ajuda do empresário Marcos Valério. Seu objetivo, segundo os ministros, era comprar apoio para o governo no Congresso. O defensor do ex-ministro apresenta nove pontos em que, segundo ele, o tribunal foi omisso, contraditório ou teria errado. Ele afirma, por exemplo, que os ministros, durante o cálculo das penas de Dirceu, consideraram em dois momentos distintos o fato de ele ser apontado como o comandante do esquema para aumentar sua punição, o que não poderia ter ocorrido.
Segundo o direito penal, um fato não pode ser considerado mais de uma vez na análise da culpabilidade de um réu. Com base nesse argumento, a defesa de Dirceu pede a redução de sua pena base, tanto no crime de corrupção ativa, como no de quadrilha, para que o fato de chefiar o esquema seja levando em conta apenas no momento dos agravantes. “Restou claro que o voto que aplicou a pena [a Dirceu] incorreu em contradição ao valorar a mesma circunstância em duas oportunidades. Houve manifesto bis in idem, contrariando frontalmente a unânime jurisprudência dos Tribunais Pátrios e dessa Suprema Corte”, diz o recurso.
No recurso de 46 páginas, a defesa de Dirceu também diz que o tribunal foi omisso, ao não considerar o seu passado, como militante político, fundador do PT e deputado federal, o que poderia, segundo o seu advogado, ser usado como atenuante na hora do cálculo da pena. Tal pedido foi feito por ele antes do julgamento, mas não foi considerado pelos ministros ao calcular a pena final. No acórdão do STF, o ministro Joaquim Barbosa afirma que “não há registros de maus antecedentes contra José Dirceu, nem dados concretos acerca de sua conduta social e personalidade”.
Citando depoimentos de pessoas como do ministro Aldo Rebelo (PCdoB-SP), do ex-presidente Lula, e da atual ministra Ideli Salvati, o advogado diz que “diversos testemunhos colhidos na ação penal revelam a existência de dados concretos sobre a personalidade e conduta social” de Dirceu. “Os fatos da vida pretérita do sentenciado são tão relevantes no momento da fixação da pena que podem, inclusive, motivar a aplicação da atenuante”, afirma.
Finalidade
O recurso de Dirceu também argumenta que o STF foi contraditório, pois somou as penas de corrupção ativa e quadrilha, quando na realidade deveria ter considerado apenas uma, ao considerar que ele agiu pela “única finalidade de instituir um projeto de poder baseado na viabilização da compra de apoio político de parlamentares por meio da entrega de recursos em espécie”. Trata-se de uma discussão técnica que envolve os conceitos de “concurso material” e “concurso formal”. No primeiro, entende-se que vários crimes foram cometidos em momentos e situações diferentes e que, portanto, sua pena deve ser somada.
Já no segundo caso, apesar de vários atos criminosos terem acontecido, considera-se tudo como se fosse um só, aumentando-se a pena. Segundo a defesa do ex-ministro da Casa Civil, se o STF considerou que o objetivo da corrupção ativa e da quadrilha era o mesmo, deveria considerar tudo como se fosse um mesmo ato criminoso e aumentar em um sexto a pena de corrupção ativa, para chegar à punição final. Na prática. Com isso, sua pena ficaria abaixo dos 10 anos estabelecidos.
Data
A defesa também argumenta que o ministro Joaquim Barbosa errou, ao apresentar “datas diferentes para a morte de uma mesma pessoa”. Trata-se do ex-presidente do PTB, José Carlos Martinez, falecido em outubro de 2003. Inicialmente, Barbosa chegou a citar a data correta da morte, mas posteriormente afirmou que ele morreu em dezembro, dois meses depois. A discussão torna-se relevante, pois em novembro daquele ano, a legislação penal mudou e as penas de corrupção passaram de 1 (mínima) a 8 (máxima) para de 2 (mínima) a 12 (máxima). Segundo a defesa de Dirceu, por conta disso, o tribunal acabou aplicando a pena mais grave no caso, quando deveria ter considerado a mais branda. Pedidos O recurso também cita o fato de ministros terem retirado do acórdão, documento com o resultado oficial do julgamento, parte de suas participações, o que teria prejudicado o entendimento do que foi decidido.
Citando vários trechos cancelados por Luiz Fux, ministro que segundo Dirceu teria prometido votar por sua absolvição, o documento afirma que “em razão da supressão das manifestações, fica impossível compreender a discussão mantida em plenário”. “Muito além da ofensa ao regimento interno dessa Colenda Corte Suprema, a supressão das manifestações dos Exmos. Ministros fere o princípio constitucional da fundamentação das decisões judiciais”, afirma a defesa de Dirceu.
Ele cita também a problemas no cálculo das multas que Dirceu terá que pagar e pede para que o embargo de declaração seja relatado por outro ministro, já que o relator do caso, Joaquim Barbosa assumiu a presidência e está fora da distribuição dos novos processo. Os 25 réus condenados no julgamento do mensalão têm até amanhã para apresentarem recursos contra a decisão do Supremo.
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