Para presidente do Sebrae, governo pode cair se não houver reforma política

(Foto: Reprodução)
(Foto: Reprodução)

Guilherme Afif Domingos, 73 anos, construiu sua imagem pública como o antipolítico. E não há ninguém mais político do que ele. Sua trajetória de alianças inclui, nessa ordem, Maluf, Quercia, Itamar, Pitta, Lula, Kassab, Alckmin e Dilma.

Com um espectro tão amplo de relações, assevera que a Lava-Jato vai atingir toda a classe política. Ninguém conseguirá escapar da lista de doações fraudulentas das empreiteiras, avisa. Menos ele, ressalva. Explica que não precisou de dinheiro graúdo para campanha porque seu foco é temático: defende há quatro décadas os pequenos negócios. Até 2018 presidirá o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Está lá desde 2015, depois de ser ministro de Dilma.

 
Fundador do PSD, participou do primeiro escalão da petista ao mesmo tempo em que era vice-governador de São Paulo, fato que criou inédita confusão jurídica.
Candidatou-se apenas uma vez à Câmara, na Assembleia Constituinte, eleita em 1986. Foi o sexto candidato mais votado à Presidência na eleição de 1989, a primeira após o regime militar. Perguntado se arriscaria de novo, devolve um enigma: “Não sei. Não posso responder isso sobre ninguém. Hoje, não se sabe quem terá condições de se candidatar em 2018”.

Existia uma expectativa de que, com a mudança de governo, a economia reagisse.  senhor acreditava nisso?
Não. O desemprego no Brasil  é estrutural, exatamente por conta de uma legislação trabalhista que não retrata mais as relações econômicas entre capital e trabalho. O mundo mudou. A revolução digital traz outras formas de convivência. Aí não se fala mais só do emprego formal, se fala da ocupação em termos do trabalho. Veja a lei da terceirização, uma coisa absolutamente óbvia, amarrada, que não acontece. A terceirização é a forma de formar cadeias produtivas com outro tipo de relação, sem ser uma legislação da primeira metade do século passado.

Por que não se muda então?
Porque você não tem uma atitude firme em termos de querer saber desse caminho. Ficamos amarrados ao corporativismo. O Brasil, hoje, sofre o mal do corporativismo público e privado. Aliás, o privado é tão forte quanto o público. Pagamos o preço. Há uma crise no mundo porque está tendo uma mudança nesse sentido. O próprio Fernand Braudel, em quem me inspirei, veio para o Brasil dizendo: “Vocês vão ver o que vai acontecer com o pêndulo político no mundo”. Ele vai girar da esquerda para a direita loucamente, exatamente porque a crise está nas cúpulas do sistema. Está nas corporações que dominaram o sistema em contraponto com uma sociedade que pede passagem, pede uma visão nova, oportunidades novas.

Quem defendia a queda da Dilma  acreditava que essa mudança pudesse ser de imediato, não?
Criou-se um clima para tal. Eu não quero dizer que não houve erros dentro do governo, mas aí você parte para um objetivo que “lavou, tá novo”, sem mexer nos problemas estruturais do país. O próprio pecado do PT foi ter consagrado o triângulo de ferro (o topo da pirâmide, onde convivem burocratas e empresários que vivem de dinheiro público) quando ele vinha representando a massa da sociedade. Mas ele foi consumido também pelo corporativismo e se aliou ao que há de pior no corporativismo privado que é o sistema empresarial brasileiro, de elite, que usa capital de fundos públicos, e não próprio. Ele criou essa relação promíscua que já existia e foi aperfeiçoada, que a Lava-Jato está revelando. E essa revelação não tem volta.

E vai acabar onde?
A Lava-Jato vai mostrar o efeito, e não adianta ser punido só o efeito, você tem que mudar a causa. A Lava-Jato vai revelar que toda a classe política está envolvida, porque antes era só o PT. Agora, no avanço, já começa a aparecer, e isso cria uma comoção dentro do Congresso, porque todos sabem. O problema que está acontecendo hoje é no sistema sobre o qual se assentou a estrutura política do Brasil, e que perdeu a legitimidade em termos de representatividade. Esse processo atinge a classe política como um todo. E a classe política agora tem dificuldade de poder fazer a lição de casa que precisa ser feita.

Qual é a lição de casa?
Vamos lembrar uma coisa que estamos devendo ao país. Eu sou constituinte e um dos autores do artigo que determinou que depois de cinco anos faríamos uma revisão da Constituição. Ela foi dentro de um clima, de um momento. Estávamos às vésperas de uma eleição presidencial que poderia mudar o rumo da história. Lembro que o muro de Berlim caiu durante a eleição presidencial. E se justificaria então, depois de um presidente eleito, um novo pacto com a Nação,  fazer uma revisão da Constituição em cima de pontos que seriam fundamentais para lançar o Brasil à base de um novo conceito de desenvolvimento. Hoje, temos que fazer essa assembleia constituinte revisional, exclusiva para fazer a reforma das reformas, que é a do sistema político e eleitoral.

Fonte: Correio Braziliense

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*